quinta-feira, 2 de agosto de 2007

Saudades

Tenho saudades de muito daquilo que fui e que nos últimos anos perdi.

Perdi a capacidade de me deixar levar pelo sentimento, pela doce melodia que as palavras de amor trazem à vida. Não me deixo aquecer com um toque terno e carinhoso e não me consigo perder num abraço profundo, cheio de sentimento, desejo e saudade.

Tenho saudades de me perder e de me encontrar, de sentir e de explorar o desejo e o prazer num toque, num beijo e num abraço dado ou recebido. Não me lembro como isso de faz. Não me lembro quando tive vontade de agir assim, sem pensar se estou no momento certo.

Perdi a espontaneadade de demonstrar o que sinto, quando, onde e como me apetece. Sinto que a minha mente controla constantemente a minha emoção e não me deixa seguir livremente os meus sentimentos.

Tornei-me fria e calculista. Limitei ao máximo a possibilidade de correr riscos. Aceito o que me dão sem contestar, mesmo que não seja o que procuro. Entrego-me a uma noite de sexo e prazer imediato em busca de outro sentimento mais forte, mas o que encontro no fim é um vazio cada vez maior que me enche o peito.

Já não sinto o meu corpo ligado aos meus sentimentos, não lhe dou o valor devido, porque perdi qualquer interesse nele. Perdi a vontade de o ver seduzir, vezes sem conta, outro corpo. Perdi a vontade de o sentir e ver estremecer de prazer e de fome de prazer por outro corpo.

Prefiro dar o que os outros querem, do que dar aquilo que tenho para dar. E é muito, porque sei que não perdi a capacidade de amar. Não perdi a capacidade de dar e sentir amor e de dar e sentir prazer. Perdi sim, a capacidade de acreditar que o posso dar e receber nas mesmas condições, de acordo com aquilo que quero e sinto.

Tenho saudades de acreditar na possibilidade de viver momentos de verdadeira paixão com um homem, sem ser somente na entrega dos nossos corpos. Mas sim, numa conversa, no silêncio da cumplicidade e da intimidade, num passeio, num abraço ou numa qualquer manifestação de carinho. Numa troca de olhares, num sorriso, num toque de mãos, num cheiro, num embalo de uma música, numa dança, num bater sincronizado dos corações e num respirar compassado envoltos em serenidade.

Amizade, amor respeito, cumplicidade, desejo, intimidade, vontade e avontade num silêncio e numa conversa franca em que expomos os nossos sentimentos sem receios, nem barreiras, sem limites nem fronteiras para o sofrimento, a dor e o tormento, que um possível fim possa causar.

Tirar lições, guardar desilusões, sem perder a capacidade de dar sem nada pedir e receber sem nada exigir. Sorrir quando apetece chorar. Ficar quando apetece fugir. Enfrentar, lutar, esquecer sem nada apagar. Mas não deixar de querer dar e receber amor.

8 comentários:

  1. como te compreendo. Acho que estamos em sintonia. A diferença é que encaro tudo com uma energia mais positiva. Não vejo nada de negro...ainda...mas sim um azul que eventualmente pode dar lugar a um amarelo, que significa o nascer do sol e por isos da paixão

    ResponderEliminar
  2. Ás vezes acho que caminho para aí também...só não sei se o encaro como tu ou como o Psyhawk... mas vou acabar por descobrir!

    Bjs

    ResponderEliminar
  3. No fundo acho que uma grande parte de nós procura o mesmo. Uma grande parte de nós tem medo de se "dar", de se magoar. Uma grande parte de nós ainda acredita que é possível...
    Não deixes de acreditar.
    Beijo grande.

    ResponderEliminar
  4. É muito isto que sinto também!

    Ao ler, vi uma diferença que me saltou logo "à vista"...
    Não tenho a certeza de não ter perdido a capacidade de dar e sentir amor...

    Não sei se sinto isso porque não quero sentir de outra forma. Se existe uma resistência, uma vontade de não sentir, de não querer gostar realmente de ninguém... Se isso advém de não conseguir acreditar que uma nova relação poderá começar sem um fim obrigatório...

    Que sentido faz envolver-me com alguém que já sabemos que estará a prazo? Como eu! Que sentido dar-me a alguém que, mais cedo ou mais tarde, me deixará pelo caminho? Me apagará da sua vida?

    Ou será somente que perdi essa capacidade? A frequência do coração já não chega lá...

    No espaço de uma ano, nem tanto se não contar com o periodo onde me recusava sequer essas pequenas coisas, saí com um numero razoável de mulheres, algumas que nada tinham a ver comigo, outras muito bonitas mesmo... A uma apeteceu-me sorrir. Uma! Mesmo assim é um sorriso sem jeito, sem vontade de empenho, sem vontade de passar disso mesmo, sem vontade de chegar à gargalhada...

    E pergunto-me... porquê?

    E... daqui a 2 anos estarei a fazer-me a mesma pergunta? Fónix! nem quero pensar nisso!

    ResponderEliminar
  5. Miguel,

    O percurso que caminhei para perceber que afinal a capacidade de dar e sentir amor ainda existe em mim foi longo e até mesmo penoso, porque chegar à fase de permitir-me sair com outras pessoas também o foi.

    Reconstruir-me, voltando a acreditar em mim, foi difícil; voltar a acreditar nos outros e na minha capacidade de avaliar o carácter dos outros foi quase impossível.

    Quanto a tempo, cada um tem o seu próprio ritmo, mas julgo-te mais 'normal' do que eu, ao nível da relação vivida e da maturidade, para demorares 2 anos a ultrapassar isso.

    E digo-te que os 2 anos que falas nem são metade do tempo de que precisei.

    ResponderEliminar
  6. Nem metade?????????

    Sim, cada um tem a sua velocidade, para tudo...
    Mas não foi o meu primeiro desgosto, digamos assim... E, racionalmente, a separação da minha mulher devia pesar muito mais, trazer muito mais duvidas... e não foi isso que aconteceu!

    Enfim, vamos ver onde este caminho leva...

    Beijoca

    ResponderEliminar
  7. Miguel,

    Sim, nem metade.

    O racional não é tido nem achado nestas situações. Para além de que, no teu casamento, tiveste tempo mais que suficiente para viver o amor e nesta última relação foi tudo muito rápido, ainda estavas a saborear os primórdios, a descobrir a ti e a outra pessoa através do amor.

    ResponderEliminar
  8. Não sou miúda de emoções controladas. Nunca fui. Destilo em todas as direcções, sem qualquer controlo emocional. No melhor e no pior de mim sou assim.

    Procuro ser alguém de emoções controladas, mas confesso que tenho medo. Ao anular ou reduzir as emoções que me fazem mal e fazem mal aos outros, não anularei também as boas emoções, as que me dão prazer? As que me permitem que eu chore se me apetecer numa sala de cinema repleta de gente, as que me permitem dar uma bela gargalhada por coisa nenhuma aos olhos dos outros mas com imensa piada para mim? Será que ao ser controlada nas emoções, vou desejar com a força que desejo neste momento, me vou entregar a alguém com a sofreguidão com o que o faço habitualmente? Será que se eu reduzir demasiado as emoções, não será o caminho para me anular a mim própria?

    Perguntas retóricas que deixo, que se calhar nunca serei capaz de encontrar resposta :)

    ResponderEliminar